
A disputa entre cooperativas de saúde, empresas prestadoras de serviços e a Prefeitura do Natal em torno do contrato para prestação de serviços médicos provocou interrupção de atendimento e falhas nas escalas de médicos de unidades de saúde da capital, como o Hospital Infantil Varela Santiago e a Liga contra o Câncer. O Varela Santiago deixou de realizar cirurgias eletivas nesta terça-feira (02). Já a Liga Contra o Câncer anunciou a paralisação de atividades ambulatoriais a partir desta quarta-feira (03). Além disso, Unidades Básicas de Saúde e Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) ficaram com escalas incompletas nesta terça-feira (02).
A Secretaria de Saúde de Natal confirmou que tem havido dificuldades para completar as escalas dos serviços. O secretário de Saúde de Natal, Geraldo Pinho, disse que os profissionais estão sendo coagidos pela Cooperativa dos Médicos e pelo Sindicato dos Médicos a não trabalharem nas novas empresas contratadas, que são a Justiz Terceirização e a Proseg Consultoria. Já a Coopmed e o Sinmed negam que tenham feito pressão para que médicos não atuem nas empresas.
Nesta terça-feira (02), a Liga Contra o Câncer anunciou a paralisação das atividades ambulatoriais a partir desta quarta-feira. “Os profissionais optaram por não aderir à nova empresa contratada pela Secretaria Municipal de Saúde, situação que levou à comunicação formal de paralisação das atividades ambulatoriais a partir do dia 03/09/2025. Até o dia 06/09/2025 (sábado), serão mantidas normalmente as cirurgias já previamente agendadas.
A partir de 08/09/2025, caso a paralisação persista, a Liga assegura que serão realizadas exclusivamente as cirurgias oncológicas classificadas como de urgência, garantindo a continuidade da assistência aos pacientes em situações críticas”, disse a Liga contra o Câncer, em comunicado.

Outra unidade afetada é o Hospital Infantil Varela Santiago, que, assim como a Liga, é filantrópico e atende pelo SUS através de contratos com o Município. Segundo o superintendente Paulo Xavier, não houve realização de cirurgias eletivas no hospital em função da falta de médicos. O atendimento ambulatorial, segundo ele, ocorreu normalmente. “Já tivemos dificuldades. Hoje não tivemos nenhuma cirurgia”, explica. “Ontem [segunda] tivemos cirurgias normalmente. Hoje não tivemos ninguém para operar. Tivemos os pacientes esperando, mas foi explicado para eles que não haveria cirurgia”, acrescentou.
Em nota, o Hospital Infantil Varela Santiago disse que os procedimentos vêm sendo cancelados pelos próprios médicos cirurgiões pediátricos. O Hospital disse ainda que nenhum profissional de uma das empresas contratadas se apresentou para dar continuidade às cirurgias. “O Hospital segue empenhado em buscar, junto às autoridades competentes, a regularização da situação para que os atendimentos cirúrgicos sejam restabelecidos o quanto antes, garantindo o cuidado integral às crianças e adolescentes atendidos”, acrescentou.
Polêmica
A contratação da Justiz Terceirização e da Proseg Consultoria, realizada de forma emergencial e com dispensa de licitação, tem sido alvo de polêmica e briga na Justiça. A 6ª Vara da Fazenda Pública chegou a suspender os contratos e exigir republicação do edital, mas o Tribunal de Justiça autorizou o prosseguimento em segunda instância, determinando a conexão das ações em trâmite. A Prefeitura argumenta que a contratação emergencial, válida por até 12 meses, busca corrigir irregularidades de repasses feitos sem respaldo legal. Em paralelo, segue aberto o pregão permanente para definir prestadores de longo prazo.
O secretário municipal de Saúde, Geraldo Pinho, disse que a transição entre a Cooperativa dos Médicos do RN (Coopmed-RN) e as duas empresas vencedoras do processo foi iniciada em 1º de setembro e está respaldada por decisão judicial de segunda instância. Ele destaca que médicos confirmaram presença em plantões, mas desistiram instantes antes após pressão do Sindicato. “Médicos que trabalhavam para a cooperativa e querem atuar nas vencedoras estão sendo ameaçados, coagidos, assediados a não assumir nas novas empresas, sob ameaça de retaliação. É um desserviço o que o presidente do Sindicato dos Médicos está fazendo com a população. A secretaria não vai se curvar, não vai ceder a chantagem nem às ameaças”, disse.
Na coletiva, o diretor jurídico da Justiz, Vencislau Carvalho, afirma que não houve irregularidades no certame. “O processo deflagrado pela Secretaria Municipal de Saúde obedeceu a todos os critérios da lei de licitação”, afirma. Para ele, o que está em curso é uma tentativa de inviabilizar as escalas, restringindo a liberdade profissional.
Ainda no dia 1º de setembro, a Coopmed divulgou nota informando a paralisação dos serviços médicos prestados ao Município do Natal, alegando “imposição da Secretaria Municipal de Saúde”. A cooperativa sustenta que a medida foi exigida mesmo diante de decisão judicial vigente que determinava a suspensão dos contratos, acusando a gestão de descumprir determinações anteriores.
Para o diretor jurídico da Proseg, Matheus Santos, a versão de que a Prefeitura teria favorecido determinadas empresas deve ser contestada. “A cooperativa médica tenta transparecer que, na verdade, foi eliminada e que haveria preferência entre as empresas. Na verdade, não existe nenhuma preferência. O que existiu foi o procedimento licitatório, que a Coopmed não conseguiu lograr êxito em ganhar”, considera.
Sindicato e cooperativa contestam
A Cooperativa dos Médicos do RN (Coopmed-RN) promoveu coletiva de imprensa nesta terça-feira (02) para rebater as acusações da secretaria de saúde sobre as pressões por parte da cooperativa e do Sinmed-RN e disse que os médicos são livres para exercerem as funções por meio das empresas.
“Não temos essa competência e não temos essa conduta por parte do ato cooperado. Os médicos são livres e respondem por si. O ato médico é responsabilidade dele. A Cooperativa, como responsável pelo médico, apenas informou que a relação contratual de repasses médicos em relação à SMS não seriam mais feitos pela Cooperativa por determinação da própria SMS”, disse o presidente Victor Vinícius.
A Coopmed alega que o contrato entre as empresas e a prefeitura foi feito de forma irregular, sustentando que a maneira como a contratação ocorreu impedia impugnações quanto aos critérios da contratação e aos julgamentos das propostas. Além disso, a Coopmed alega que o processo feito pela Prefeitura não possibilitou ampla concorrência e cobra na Justiça a republicação do edital. A cooperativa disse ainda que a prefeitura não comunicou oficialmente o encerramento do contrato à Coopmed.
Já Geraldo Ferreira, presidente do Sinmed-RN, defende que a coação e o assédio estão sendo realizados pelas empresas e a SMS, sob acusação de que cargos comissionados estariam fornecendo escalas e telefones dos médicos. “Nós vamos denunciar o secretário Geraldo Pinho por gestão temerária que coloca em risco a população de Natal”, afirma.